Vice-presidente da APACEFOR e Procurador do Município de Fortaleza, Mário Sales, tem artigo publicado no Jornal ‘A Notícia do Ceará”

Por Mário Sales Cavalcante

A segurança jurídica é um dos princípios fundamentais do Estado de Direito. Ela é, na verdade, uma das notas caracterizadoras de uma organização estatal minimamente civilizada e obediente ao ordenamento jurídico. É dizer: não havendo segurança na formação e desenvolvimento das relações jurídicas não há que se falar em Estado de Direito.

Desse modo, embora não esteja previsto expressamente na Constituição Federal de 1988, o referido princípio é tido como inerente ao sistema jurídico brasileiro, tendo sobre ele uma importância essencial, uma vez que toda a produção do direito deve se pautar conforme esse postulado.

Dois são os aspectos básicos em que o princípio da segurança jurídica se divide: certeza e previsibilidade. A certeza traduz-se no sentimento do indivíduo de estar seguro quanto à norma aplicável ao caso, ou seja, qual norma que regula a situação jurídica concreta (um negócio jurídico p.ex.) e que está vigente. A previsibilidade diz respeito à segurança quanto à estabilidade dos efeitos das relações jurídicas constituídas, eis que é preciso assegurar ao cidadão que direitos adquiridos não poderão ser desfeitos a qualquer tempo.

No atual contexto da realidade brasileira, contudo, fica claro o quanto a segurança jurídica é muitas vezes alvo de verdadeiros atentados pelos Poderes Constituídos da República. O próprio Estado Brasileiro ao invés de garantir à sociedade a necessária estabilidade na criação e interpretação do direito, age de modo a semear dúvidas e incertezas quanto à aplicação das leis vigentes.

Tal é o caso da propalada reforma da previdência que, sob o pretexto de combater privilégios, apresenta o sério risco de atingir e prejudicar situações já consolidadas daquelas pessoas que adquiriram direitos sob o manto protetor de uma legislação válida e em vigor. Em que pese o debate político em torno do tema ter sido colocado momentaneamente de lado, é preciso extremo cuidado com o trato dessa questão quando do seu retorno à agenda do Governo Federal.

Outro exemplo que bem ilustra o quanto afirmado acima é a interminável discussão na nossa mais alta Corte de Justiça quanto ao início do cumprimento da pena de prisão para os condenados em segunda instância.  De fato, apesar de haver decidido em 2016 acerca dessa possibilidade, o Supremo Tribunal Federal dá sinais evidentes de que existem dissonâncias de posicionamentos de seus ministros sobre essa matéria, tendo retornado a apreciá-la no primeiro semestre desse ano e mantido por maioria mínima (seis ministros votaram a favor e cinco contra) o entendimento firmado há dois anos. Porém, o assunto ainda repercute bastante no STF e tudo leva a crer que, em futuro recente, essa questão será objeto de pauta e reapreciada em novos julgamentos.

Nesse cenário, há aqueles que já colocam em dúvida um verdadeiro avanço conquistado pela sociedade brasileira com a chamada “Lei da Ficha Limpa”: a inelegibilidade daquelas pessoas condenadas por decisão colegiada. O pano de fundo seria a possível candidatura de Luis Inácio Lula da Silva ao cargo de Presidente da República, que embora condenado pelo Tribunal Federal da 4ª Região conseguiria por força de medida judicial concorrer no citado pleito.

Cumpre à sociedade, portanto, ficar atenta e cobrar de nossas instituições o necessário respeito à segurança jurídica enquanto vetor primordial do Estado Brasileiro.

Fonte: A Notícia do Ceará (leia aqui)